Ao menos 549 doses de vacinas foram alvo de roubo, furto ou venda ilegal no Brasil
Foto: Divulgação Polícia Militar de Goiás
Durante um serviço na sede da Secretaria Estadual de Saúde de Goiás na semana passada, um técnico de refrigeração subtraiu quatro ampolas da vacina contra Covid-19 e as vendeu. Na última terça (6), ele voltou ao local para novo reparo e levou outra caixa com 20 ampolas, que seriam comercializadas na cidade de Senador Canedo. O caso é o primeiro furto de imunizantes reportado oficialmente no estado, mas ao menos mais 16 episódios relacionados a roubos, sumiços e venda ilegal de vacinas ocorreram este ano no país, conforme identificou ÉPOCA.
Levando em conta tais casos, comunicados às autoridades, houve uma defasagem de 549 doses em meio à campanha nacional de imunização, cujo ritmo ainda é lento. Estados têm encarado essas ações como ocasionais, embora verifiquem um aumento sobretudo de interessados em intermediar negociações de vacinas, o que é vedado. A Câmara aprovou nesta semana o texto-base de um projeto de lei que permite ao setor privado comprar imunizantes sem destiná-los integralmente ao Sistema Único de Saúde (SUS), como prevê a legislação atual. O texto ainda passará pelo Senado.
“O que a gente tem visto é tentativa de pessoas querendo intermediar venda de vacinas. Isso é uma coisa que está recorrente, e chegamos a espantar alguns que tentaram atuar aqui no estado. Não chegaram a oferecer porque a gente bloqueia, mas tenho ouvido, de forma recorrente, que é uma preocupação dos gestores nos estados”, disse o secretário de segurança pública de Goiás, Rodney Miranda.
Oficiado a respeito do furto em Goiás, o Ministério da Saúde disse não ter dados referentes a casos envolvendo roubos de vacinas. Já a Anvisa afirmou que sua atuação se dá “no sentido de proteger a saúde da população, contribuindo para que produtos que não atendam aos padrões de qualidade, segurança e eficácia não sejam colocados à disposição”.
Em resolução publicada no ano passado, a agência orienta que “os medicamentos objetos de furto, roubo ou outras apropriações indevidas, ainda que tenham sido recuperados, devem ser rejeitados”. Eles só podem ser reintegrados ao estoque comercial se não apresentarem dano ou violação e concluídos como adequados do ponto de vista da qualidade, segurança e eficácia.
Veja abaixo os casos de roubos, furtos e sumiços identificados por ÉPOCA:
1) Venda ilegal em Senador Canedo
Policiais prenderam nesta quarta-feira (7) um suspeito de roubar vacinas contra Covid-19 e vendê-las em Senador Canedo, na região metropolitana de Goiânia. Um homem de 28 anos foi detido com três ampolas do imunizante CoronaVac, as quais ele tentava comercializar por um aplicativo de celular. Em sua residência, foram encontradas outras 17 ampolas. No total, a carga apreendida seria suficiente para aplicar 200 doses. Outras 40 doses já haviam sido repassadas, e as autoridades buscam localizar os compradores. Acredita-se que o medicamento não surtiu efeito devido às condições em que foram armazenadas pelo acusado, até então único envolvido no crime.
2) Assalto em São Paulo
Em um dos maiores roubos de vacinas registrados no país até agora, ladrões levaram, no dia 24 de março, 98 doses da UBS Vila Império II, em Americanópolis, Zona Sul da capital paulista. Armados, dois homens que chegaram ao local de moto renderam uma enfermeira, que foi obrigada a mostrar a geladeira onde estavam as ampolas. A dupla fugiu com nove frascos da Coronavac, cada um com 10 doses, e outro aberto, com oito doses.
3) Roubo no Rio de Janeiro
Um homem de aproximadamente 30 anos roubou 50 doses da vacina CoronaVac no Centro Municipal de Saúde Professor Carlos Cruz Lima, no bairro Colégio, na Zona Norte do Rio, na madrugada do último dia 4. Vídeos flagraram o suspeito, com uma mochila nas costas, forçando a entrada na sala de imunização. O caso é apurado pela 6ª DP (Cidade Nova).
4) Assalto em Natal
Bandidos armados renderam duas funcionárias da Unidade Básica de Saúde (UBS), na Vila de Ponta Negra, em Natal (RN), e levaram 20 doses da Coronavac em 22 de março. Dois suspeitos foram detidos, mas os imunizantes não foram recuperados. Em entrevista a ÉPOCA, uma das enfermeiras rendidas relatou que os criminosos eram bem agressivos e apontaram a arma para sua cabeça.
5) Furto em Mossoró
Duas caixas contendo 10 doses da vacina desapareceram da UBS do bairro Belo Horizonte, na zona sul de Mossoró, no Rio Grande do Norte. O sumiço foi descoberto no dia 30 de março, quando estava prevista a imunização de idosos com idade entre 67 a 69 anos. Um inquérito foi aberto para apurar o caso, que estava sendo tratado inicialmente como furto.
6) Falsa enfermeira de Minas Gerais
A cuidadora de idosos Cláudia Mônica de Freitas, que se passava por enfermeira, foi presa por comercializar e aplicar supostas vacinas contra Covid-19 em empresários do ramo de transportes de Minas Gerais. O grupo e seus familiares teriam tomado indevidamente a primeira dose do imunizante, como revelou a revista Piauí. Investigação da Polícia Federal indica que as vacinas são falsas. Um laudo pericial confirmou que parte do material apreendido na casa da cuidadora era soro fisiológico. A suspeita é de que ela estava aplicando as supostas doses desde 3 de março.
7) Sumiço em Canindé
A Polícia Civil investiga o furto de dois frascos de CoronaVac, com 10 doses cada, no município cearense de Canindé. Os imunizantes foram levados do Centro de Saúde Chico Campos (CSCC) em 22 de fevereiro, após o fechamento da unidade. A falta foi notada na manhã seguinte durante contagem de praxe.
8) Furto em Apiúna
Dez doses da vacina contra o coronavírus foram furtadas de um posto de saúde no município catarinense de Apiúna, no Vale do Itajaí. Funcionários perceberam a falta dos frascos de dentro de uma geladeira e notificaram a Secretaria de Saúde, que registrou um boletim de ocorrência. O desaparecimento foi comunicado no dia 10 de março.
9) Desaparecimento em Terra Roxa
Trinta doses da vacina contra Covid-19 foram furtadas de uma unidade básica de saúde de Terra Roxa, no oeste do Paraná. Os frascos sumiram em 31 de março. No dia seguinte, o município registrou a ocorrência.
10) Outros casos
Um homem foi preso em Milagres, no interior do Ceará, suspeito de furtar uma dose de vacina contra Covid-19 e outros materiais hospitalares de um Posto de Saúde da Família (PSF). Ele foi detido em 1º de abril.
No município mineiro de Contagem, um frasco com 10 doses da CoronaVac desapareceu da UBS do Vale das Amendoeiras. A falta foi percebida por uma enfermeira na manhã do último dia 5. A principal hipótese é de extravio do frasco, já que não foram detectados sinais de arrombamento. Também em Minas Gerais, duas doses foram furtadas no Hospital Regional de Janaúba, no norte do estado.
Outras duas doses foram foram furtadas da UBS Parque Reid, em Diadema (SP), em janeiro. A ausência foi percebida pela gerente da unidade no dia 22 daquele mês No mesmo estado, a Santa Casa de Limeira denunciou no final de fevereiro um possível desvio de 40 doses contra a doença.
Em Rondônia, duas doses de vacina desapareceram de dentro da Rede de Frios de Guajará-Mirim, localizada no Núcleo de Vigilância Epidemiológica e Ambiental (Nuvepa). O caso foi informado à Polícia Civil pelo Conselho Municipal de Saúde em março. No mês anterior, quatro doses sumiram de um posto de saúde na cidade gaúcha de Caxias do Sul.No último dia 25, a PF também desarticulou um grupo suspeito de oferecer de maneira fraudulenta 200 milhões de doses de vacina contra a Covid-19 ao Ministério da Saúde em nome da farmacêutica AstraZeneca. De acordo com as investigações, ao menos dois homens apresentaram credenciais falsas para negociar lotes do imunizante com a pasta. Principal alvo da operação Taipan, o empresário Christian Pinto Faria fez contato direto com o secretário-executivo do ministério, Élcio Franco. Ao jornal Estado de S. Paulo, Faria disse que foi vítima de um golpe e afirmou que tem imunizantes para negociar.
*Época