Fraudes deixam Idema sem saldo

O desvio de pelo menos R$ 19,3 milhões do Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente (Idema), entre 2013 e 2014, provocou o descontrole no pagamento de fornecedores, convênios e até mesmo no Progás, que é um programa de incentivo ao desenvolvimento industrial financiado pelo Governo do Estado e administrado pelo Instituto. Além do programa estadual, o órgão acumulou dívidas da ordem de R$ 4 milhões em repasses mensais não-efetuados aos Tribunais de Justiça e do Trabalho para pagamento de precatórios. 

Os detalhes das consequências administrativas do maior esquema de subtração ilegal de recursos públicos no Rio Grande do Norte até hoje, estão dispostos ao longo de 249 páginas e foram publicizados ontem pelo Ministério Público Estadual (MP/RN). 

No documento, que embasou a decisão do juiz Guilherme Newton do Monte Pinto, titular da 6ª Vara Criminal de Natal, em decretar prisões temporárias, sequestro de bens, conduções coercitivas e mandados de busca de apreensão, cumpridos semana passada com a deflagração da Operação Candeeiro, contam trechos do depoimento do atual diretor-geral da autarquia, Rondinelle Silva Oliveira. 


Questionado pelo Ministério Público Estadual sobre como encontrou as contas do Idema ele disse, no dia 12 de junho passado, que quadro era de uma situação difícil, com pouco dinheiro em caixa e muitas contas a pagar.
“A gente tinha um saldo muito pequeno nas contas do Idema e tinha um grande volume em aberto de pagamentos. 

Em todas as esferas. E aí eu posso listar: tinham pagamentos em aberto na parte de colaboradores, como por exemplo… os conveniados estavam em aberto. (…) A gente tinha pendências em todos os sentidos. 

Pendências com convênios; pendências com pagamentos; com consignações; pendências com precatórios – que estavam em atraso; pendências com o Progás, que é um programa que está vinculado (sic) via Idema (…). Isso tem trazido para a administração sérios problemas pra poder fazer que o órgão funcionasse (sic)”, disse o atual diretor aos promotores de Defesa do Patrimônio Público.

Indagado, na mesma ocasião, se o então diretor-administrativo, Gutson Jonhson Giovany Reinaldo Bezerra, que pediu exoneração do órgão em maio passado, não esclarecia os motivos pelos quais não havia dinheiro suficiente em caixa, Rondinelle Silva Oliveira frisou que era uma questionamento que nem ele e nem as pessoas mais próximas no órgão sabiam responder. “Era uma pergunta que eu confesso que eu sempre me fiz. 


E fiz, assim, com as pessoas mais aproximadas (sic)… Mas ele (Gutson) nunca chegou a me justificar”. Conforme explicitado pelo atual diretor do Idema aos promotores, a não-quitação das contas administrativas seria justificada, conforme “alegação de corredores”, pela baixa arrecadação do Governo do Estado ao longo de 2014.

“Eu não consigo confirmar isso daí porque hoje a gente, mesmo com essa crise que está no Brasil, nesse ano já, agora no mês de junho, a gente está praticamente com tudo em dia – já 2015 – e a gente conseguiu também saldar a maior parte dessas contas que ficaram em aberto em 2014. 


Já começamos a pagar os precatórios, que eram os obrigatórios, já na ordem de mais de R$ 4.000.000,00 ou, aproximadamente, R$ 4.000.000,00 e também já negociamos o Progás. Também já estamos em dia com o Progás. Ou seja, é um bom volume de recurso que a gente está conseguindo disciplinar e manter o sistema funcionando”, comparou Rondinell Oliveira.

Passo a passo do Esquema
No documento publicado ontem pelo MPRN, os promotores que assinam a peça 


– Paulo Batista Lopes Neto, Keiviany Silva de Sena, Hellen de Macêdo Maciel e Hayssa Kyrie Medeiros Jardim – chamam atenção de que “os artífices do desvio possuíam conhecimento de circunstâncias elementares acerca da fiscalização da despesa pública e que os assegurariam sobre futura impunidade”.
Veja abaixo o passo a passo do esquema utilizando o ofício-pagamento e como os envolvidos se sentiam amparados por não informarem as despesas aos órgãos e sistemas de controle. 

 1) A emissão de ordem bancária, caminho natural para o gasto transparente e contabilmente aceito, não prescindiria do lançamento no SIAFI – Sistema Integrado de Administração Financeira, o que fatalmente facilitaria o acompanhamento aos interessados e, mais que isso, seria determinante para a contabilização da despesa; 

 2) A fiscalização pelo Tribunal de Contas depende exatamente da “informação” sobre a existência da despesa; sonegá-la impediria – salvo evento futuro, incerto e indesejável – que o referido órgão viesse a tomar conhecimento do desvio; 

 3) Por fim, e relacionando os itens anteriores, o Tribunal de Contas, ao realizar o cruzamento de dados colhidos, utiliza-se exatamente dos lançamentos no SIAFI; não havendo registro da despesa no SIAFI e tampouco sendo esta informada ao Tribunal de Contas, ter-se-ia uma certa “segurança”; 

 4) O mapeamento dos valores oriundos de arrecadação própria de autarquisas como o Idema – notadamente depositados nas contas utilizadas – é extremamente dificultado, diferentemente das quantias oriundas do Orçamento Geral do Estado – OGE , sindicáveis por simples cruzamento informatizado de informações.

MemóriaO MPRN deflagrou a Operação Candeeiro quarta-feira (02). 


A ação busca descortinar esquema milionário no âmbito do Idema entre os anos de 2013 e 2014. Uma suposta associação criminosa instalada na Unidade Instrumental de Finanças e Contabilidade, em comunhão de desígnios com o então Diretor Administrativo e com auxílio de terceiros estranhos ao órgão, utilizava-se de ofícios autorizadores de pagamento como forma de desviar recursos em benefício próprio ou de terceiros. 

 Segundo apurado até o presente momento, os valores desviados dos cofres do Idema em favor de tais empresas contabilizam o montante de R$ 19.321.726,13, mais da metade advindos de conta oculta, aberta em março de 2013. Cinco mandados de prisão temporária, 10 mandados de condução coercitiva e 27 mandados de busca e apreensão, expedidos pelo Juízo da 6ª Vara Criminal da Comarca de Natal, que igualmente decretou o sequestro de bens e valores de pessoas físicas e jurídicas alvos da investigação. 

Em razão dos elementos colhidos durante a investigação, restou demonstrada a materialidade e fortes indícios de autoria dos crimes de quadrilha/associação criminosa, peculato, lavagem de dinheiro, falsificação de documento público, uso de documento falso, extravio, sonegação ou inutilização de livro ou documento.

*Tribuna do Norte
Postado em 9 de setembro de 2015