Foto: Roque de Sá
A Comissão de Segurança Pública (CSP) aprovou nesta terça-feira (28) o projeto que tipifica como atos terroristas as condutas praticadas em nome ou em favor de grupos criminosos organizados, tais quais as registradas recentemente no Rio Grande do Norte. A proposta também altera as penas para esses atos.
O PL 3.283/2021 foi apresentado pelo senador Styvenson Valentim (Podemos-RN), e altera a Lei Antiterrorismo (Lei 13.260, 2016), a Lei Antidrogas (Lei 11.343), a Lei das Organizações Criminosas (Lei 12.850), e o Código Penal (Decreto-Lei 2.848, de 1940), para equiparar as ações de grupos criminosos organizados à atividade terrorista.
O parecer foi elaborado pelo senador Alessandro Vieira (PSDB-SE) e lido ad hoc pelo senador Hamilton Mourão (Republicanos-RS) com a inclusão de algumas emendas. Alessandro também incluiu os atentados e ameaças à vida de funcionários públicos nas ações tipificadas como crime. A mudança foi feita depois que, no dia 22 de março, uma operação da Polícia Federal (PF) prendeu nove integrantes do Primeiro Comando da Capital (PCC), que planejavam atacar servidores e autoridades públicas.
Com isso, serão equiparados ao crime de terrorismo as condutas de participação, promoção, planejamento, organização, ameaça, comando, facilitação ou financiamento de atentado a vida ou integridade dessas pessoas.
A proposta segue agora para a decisão final da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ).
Ameaça às instituições
Styvenson criticou o fato de as organizações criminosas ameaçarem o Estado e suas instituições e, mesmo assim, serem autuadas com uma legislação antiga, à qual, segundo ele, não penaliza de forma correspondente os criminosos.
“Não dá para chegar ao limite de ter autoridades, de ter funcionários públicos, pessoas sendo ameaçadas pelo grupo organizado, pelo crime organizado, pelas milícias. Eu falo de criminosos, não estou falando de organizações civis que buscam ali seus direitos políticos. Estou falando de organizações criminosas que articulam, que planejam, que de forma ardilosa, atentam contra a vida de pessoas que utilizam da lei para manter a segurança, a ordem, a paz dentro dos nossos estados”, afirmou Styvenson.
O projeto prevê que serão punidas com pena de 12 a 30 anos de prisão condutas praticadas em nome ou em favor dessas organizações que, entre outras: limitam a livre circulação de pessoas, bens e serviços e mantenha monopólio territorial, qualquer outro tipo de controle social ou poder paralelo, seja em zona urbana ou rural, com uso de violência ou ameaça.
O texto explicita que as atividades equiparadas a terrorismo serão aquelas consideradas mais gravosas, que afetam e causam terror na vida de comunidades e regiões, o que inclui o tráfico de drogas e a formação de milícias.
Por outro lado, a constituição de duas ou mais pessoas para organizar, manter ou custear organização paramilitar, milícia particular, grupo ou esquadrão terá pena de cinco a dez anos de prisão e pagamento de R$ 2 mil a R$ 3 mil de multa por dia. Hoje a penalidade é de um a três anos de prisão. A fixação dessa pena veio após pedido do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ). O parecer de Alessandro previa pena de quatro a dez anos de reclusão.
Em relação à Lei Antidrogas, a proposta enquadra no crime de terrorismo a associação de duas ou mais pessoas para o fim de praticar, reiteradamente ou não, o tráfico de entorpecentes. Também nesse caso, Mourão decidiu acatar de Flávio Bolsonaro fixando a mesma pena: reclusão de cinco a dez anos, e pagamento de R$ 1,2 mil a R$ 2 mil de multa por dia. Atualmente, a pena é de três a dez anos de prisão, e pagamento de R$ 700 a R$ 1,2 mil de multa por dia. O parecer inicial previa prisão de quatro a dez anos.
Atentados a autoridades
Alessandro ressalta em seu parecer que “as atividades equiparadas a terrorismo são aquelas consideradas mais gravosas, que afetam e causam terror na vida de comunidades e regiões”. Inicialmente ele havia colocado no seu voto que os atos a serem tipificados são os com a “finalidade de provocar terror social ou generalizado, expondo a perigo pessoa, patrimônio, a paz pública ou a incolumidade pública”. Mas acabou acatando sugestão de Flávio Bolsonaro e Jaques Wagner (PT-BA) substituindo a expressão “terror social” por “distúrbios civis”.
O texto do relator ainda equipara a terrorismo às condutas de promoção, participação, planejamento, organização, ameaça, comando, facilitação ou financiamento de atentado contra a vida ou integridade física de funcionário público, sem prejuízo das sanções correspondentes à violência, e de fuga de presos, exclusivamente quando praticadas por grupos criminosos. No conceito de funcionário público estão incluídos servidores estatutários, celetistas, membros dos Poderes e eventuais funcionários temporários.
“O agente da lei é que tem que se proteger, não tem liberdade para circular. Então, nós estamos perdendo a guerra. Não reconhecer que nós estamos perdendo a guerra já é ruim. Então eu acho que esse projeto é mais do que oportuno”, disse o senador Esperidião Amin (PP-SC) ao elogiar a iniciativa.
O texto original previa a inclusão do requisito de quatro ou mais pessoas para a configuração dos crimes de associação para o tráfico e constituição de milícia privada, mas o relator retirou a previsão porque considerou que poderia ter como consequência a extinção do delito antes previsto no ordenamento jurídico, descriminalizando as condutas realizadas sob a vigência da lei anterior.
Milícias
O relator considerou o projeto pertinente e necessário para tornar mais efetivo o combate aos grupos criminosos organizados no país. “O desaparecimento do indigenista Bruno Pereira e do jornalista inglês Dom Philips em 2022, encontrados mortos, apontam o fenômeno do alastramento das organizações criminosas oriundas do Sudeste pelo país, direcionando interesses para a Região Amazônica em que são estabelecidas conexões e simbioses entre diferentes tipos de crimes, com a formação de redes transnacionais”, afirmou no parecer.
Durante o debate, os senadores destacaram que as populações que mais sofrem com a atuação de organizações criminosas são aquelas reiteradamente excluídas do acesso a serviços estatais básicos em razão da ação dos próprios grupos criminosos e pela configuração de novos atores que se estabeleceram nos últimos vinte anos: as milícias. Eles ressaltaram que esses grupos têm imposto decisões legais e extralegais às comunidades e controlam a economia de territórios de maneira ilícita e violenta.
“Não é possível que um brasileiro não fique triste com os dados. Nós vivemos num país que, tradicionalmente foi marcado pela convivência, pela coexistência, pela tolerância entre os diferentes, um povo cordial, como se dizia. Mas nós temos zonas de exclusão”, observou Amin.
O protesto foi reforçado pelos senadores Magno Malta (PL-ES) e Eduardo Girão (Podemos-CE). Eles observaram que essa zona de exclusão vem crescendo ao longo dos anos por uma série de fatores. Entre eles, a falta de políticas preventivas e de políticas de enfrentamento.
“Lá no Ceará tem cidadão, não só em Fortaleza, como no interior do estado, que precisa pedir autorização para entrar no seu bairro. Autorização a facções criminosas. O crime organizado está mandando ao ponto de expulsar famílias (…). Eu acho que a gente está dando um passo”, disse Girão.
*Agência Senado